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Como Vampiros Antigos

Um Último Adeus

"Eu queria que você nunca me amasse.
Desde a primeira vez que você cruzou aquela porta, eu percebi que seria um erro, sabe? Eu senti um frio na barriga, fiquei um pouco zonzo e mudo. Eu não conseguia parar de olhar para os teus cachos cor de cobre que pendiam na frente do teu rosto. A maneira como você delicadamente sorriu enquanto colocava aquela mecha de cabelo por detrás da orelha e perguntava se eu estava bem.
Era tão doce o seu olhar, escondido atrás daqueles óculos e fitando minha cara de tonto, como quem estava preocupada comigo, um completo desconhecido que ficou paralisado só de olhar pra você.
Aquele dia foi incrível, não? Okay, eu entendo que pode não ter sido tanta coisa pra você, mas pra mim foi, não sei se foi perceptível pela descrição que eu acabei de fazer, mas tudo bem.
Onde eu estava? Ah sim, você não poderia me amar, certo...
Você sabe, você foi minha melhor amiga ao longo de todos esses anos e eu sempre estive sozinho, exceto por você. Antes de te conhecer, eu magoei várias mulheres, foi uma máxima na minha vida, sempre que alguém me amava, sairia machucada, não que fosse minha culpa... bem... não totalmente, é claro.
Eu sabia disso, sabia que isso sempre aconteceria e, por algum motivo, eu não queria que isso acontecesse com você. Não queria te magoar e ver você se afastar em seguida, algo me dizia que você era preciosa demais pra eu perder e se você me amasse, mesmo que por uma fração de segundo, eu ia te perder.
Então, eu fiz a única coisa que eu poderia fazer, eu te amei.
Eu nunca fui um cara sortudo, o amor pra mim nunca foi uma via de mão dupla, por que seria agora? Então eu te amei com todo o meu coração, foi a... coisa... mais forte que eu jamais senti. Foi difícil me manter em silêncio, mas eu consegui, pelo menos até hoje.
E se estiver se perguntando se eu ainda te amo, é claro que sim. Eu também sabia que se eu parasse de te amar, se por pelo menos um dia eu desviasse esse meu amor de você, você iria me amar e eu não te amaria, adivinha o que aconteceria em seguida?
Imagino que toda vez que eu digo "eu sabia que", você se contorce por dentro de ódio, acho tão legal a maneira como você detesta a minha prepotência e minha mania de estar sempre certo. E imagino que agora você sente vontade de me matar por ter adivinhado esses teus sentimentos loucos. Mas é algo que sempre gostei em você, sua maneira de detestar tudo o que eu sou, mas sem me abandonar nem sequer por um milissegundo. Eu sempre me senti seguro com você, até agora.
Por que estou dizendo tudo isso agora?
Porque acabou. Eu já não conseguiria conviver com isso dentro de mim, então, estou indo embora.
Você nunca mais vai me ver, espero que seja feliz... É claro que você vai ser feliz, não é mesmo? Você é incrível, tenho certeza de que isso não será um desperdício.
Bem, acho que é isso.
Adeus.

Apaixonadamente e de coração partido,

Julio"

—Ellen?

Ela saiu de seu transe, tirando a atenção da carta e olhando para a irmã.
—Ellen, você está bem?

—Sim, é só... nada, não foi nada.
—Então, está pronta?
—Claro, está na hora?
—Sim, mas o Julio não veio, o que dizia a carta?
—Ah sim... Ele ia viajar hoje, mas deixou os parabéns.
—Que rude, ele viajar bem no dia do seu casamento, mas tudo bem, quem precisa dele afinal?
—É... Quem precisa...

—Vamos logo. — A irmã disse ao se retirar


Ellen deixou a carta na penteadeira, limpou os olhos úmidos antes que borrassem sua maquiagem. Pegou o buquê sobre a cadeira ao lado e foi andando para fora da casa, em direção ao jardim. Seu vestido branco reluzia sob o sol fraco do outono. Todos os convidados olharam para ela, a marcha nupcial era um som distante. Por um segundo ela congelou, olhou para a cadeira onde Julio deveria estar. E seguiu em frente, com um sorriso no rosto, para o altar.

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