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Como Vampiros Antigos

Primeiro Último Beijo

O frio nos ossos incomodava Vanessa, ela se abraçava na tentativa de preservar o calor do corpo. A roupa toda molhada, o vento batendo contra o rosto, a chuva que caía. Tudo aquilo deveria valer a pena, ela esperava que sim.
Atravessou a praça da Savassi correndo, tocou o interfone e ficou tremendo sob a marquise do edifício por ao menos um minuto.

—Oi, quem é? — Uma voz grave e um pouco rouca respondeu.
—Sou eu, Vanessa. — Ela fez uma pausa. — Está chovendo muito aqui fora, abre logo.
—Okay, sobe logo, vou pegar uma toalha.

Ele desligou o interfone, com um clique o portão do prédio se abriu. Vanessa entrou rapidamente e, ignorando o elevador, subiu as escadas pulando os degraus de dois em dois. Apesar do frio, sentia que seu corpo ficava quente à medida que se aproximava do apartamento número 306.
Subiu mais um lance de escadas e alcançou o terceiro andar, alguns passos e estava parada de frente para a porta, ofegante após subir as escadas. Bateu à porta.
Alguns segundos depois, um som de passos e chaves foi ficando mais próximo e a porta se abriu. Gustavo estava descalço e sem camisa, vestindo somente uma bermuda e segurando a toalha nas mãos.

—Entra logo, sua maluca. — Ele disse ao envolvê-la com a toalha e puxá-la para dentro do apartamento.
—Eu preciso falar com você, Gu. — Vanessa respondeu.
—Só um minuto, vou colocar uma camisa e pegar uma roupa pra você. — Ele disse sem dar muita atenção. — Corre para o banheiro e vai tomar um banho logo, antes que você pegue uma pneumonia, essas coisas são perigosas.

Ela sorriu e foi para o banho. Pouco tempo depois ele bate à porta para entregar uma roupa que ela havia deixado ali em outra ocasião. Ao sair, ainda com os cabelos molhados, Vanessa se deparou com Gustavo conversando com Elisa, sua ex-namorada.

—Oi, Vanessa, não sabia que você estava aqui. — Elisa disse com um tom levemente acusador, em seguida olhou para Gustavo.
—Não sabia que vocês tinham voltado.
—Não voltamos mesmo. — Ele interrompeu e apontou para uma caixa. — Ela só veio buscar algumas coisas que ainda estavam aqui. Já estava de saída, não é, Elisa?
—É, claro, não quero interromper nada. — Elisa disse pegando a caixa que estava sobre o sofá. — Foi bom ver você.
—Eu te acompanho até o elevador. — Em seguida se virou para Vanessa. — Pode ficar à vontade, como sempre.

Gustavo e Elisa saíram do apartamento, Vanessa se sentou no sofá e conseguiu escutar os dois discutindo do lado de fora.

—Você mal esperou o meu lado da cama esfriar e já chamou a Vanessa para aquecer? — Elisa disse quase gritando. — E vem com essa história de que ela era só sua amiga né? Por quanto tempo você me traía com ela?
—Não é nada disso, ela acabou de chegar, precisava falar comigo.
—Claro, com certeza, Meu Deus, como eu fui burra, aposto que ela esteve aí todas as vezes que eu viajei né? Conversando. Só conversando. Bem que eu reparava no jeito que ela ficava te olhando.
—Sabe, se ela gostasse de mim, até que poderia haver algo mais. — Gustavo disse, agora era ele quem aumentava o tom. — Pena que ela não gosta, tenho certeza de que ela faria eu me sentir bem, muito melhor do que você fez.
—Você é um idiota, Gustavo.
—Eu sou o idiota? Você vem aqui semanas depois que a gente terminou e decide tirar satisfações comigo? Eu não lhe devo satisfação nenhuma da minha vida agora. E seu namoradinho? Onde está ele? Por que você não sai daqui logo e vai perguntar onde ele esteve enquanto você me enchia o saco por coisas inventadas que você nem deveria se intrometer?

Gustavo entrou e bateu a porta. Ficou apoiado nela, olhando para a maçaneta por quase um minuto. Respirando profundamente. Em seguida se virou e percebeu Vanessa olhando para ele com olhos surpresos, foi andando quase que se arrastando e se jogou no sofá de frente para o que ela estava. Ficou deitado olhando para o teto e eles ficaram em silêncio. Ele levou a mão até a testa e se virou para Vanessa.

—Desculpa por você ter ouvido isso. Desculpa mesmo.
—Não tem problema. — Ela respondeu timidamente enquanto brincava com o cabelo.

Eles fizeram silêncio novamente. Ele fechou os olhos e começou a cochilar. Vanessa se aproximou lentamente dele, perto do sofá onde ele estava, se abaixou e beijou-o nos lábios. Gustavo se levantou num salto, assustado, olhou para Vanessa e viu o que havia acontecido.

—Nêssa, não... acho que você entendeu errado. — Ele disse segurando sua mão.
—A Elisa estava certa, Gu, eu gosto de você mais do que você imagina, só que você sempre esteve namorando eu nunca tive coragem de te dizer, então preferi que continuássemos amigos.
—Eu não fazia ideia...
—Eu vim aqui justamente pra te falar isso hoje. Antes que você começasse a namorar outra pessoa e eu tivesse que ficar em silêncio outra vez. — Ela disse sorrindo.
—Mas, Nêssa, não vai rolar, não agora. Apesar de tudo eu ainda tenho sentimentos pela Elisa, você é uma garota incrível, eu não faria isso com você, me desculpa.
—Entendo, bem, acho melhor eu ir embora antes que eu queira me enterrar de vergonha. — Ela disse rindo nervosamente.
—É, talvez seja melhor. Pelo menos por agora.

Eles se levantaram e saíram do apartamento, ele trancou a porta e foi acompanhando ela até o elevador.

—Depois você volta aqui e pega as roupas que deixou. Ou não, vai que acontece de você precisar né? Melhor deixá-las guardadas. — Ele disse e acariciou o rosto dela.
—É, depois eu volto aqui no meio da chuva pra fazer mais uma declaração de amor ridícula.
—É, só você pra fazer coisas assim. — O elevador chegou e eles entraram, ele segurou a mão dela e disse. — Sabe, qualquer dia desses a gente pode tomar um café, quando toda essa bagunça na minha cabeça acabar. Eu gosto de você, Nêssa, só não é a melhor hora pra mim.
—Eu entendo. Mas então vamos tomar um café? Discutir a relação, essas coisas?
—É, basicamente é isso.
—Uhm, aceito, mas lembre-se de me levar flores se você quiser me conquistar, rosas vermelhas, é claro, e faça uma declaração de amor, é importante que seja melosa pra eu não me sentir pra baixo com essa coisa que fiz hoje.
—Claro, pode deixar. — Ele disse sorrindo.

Eles se abraçaram e ele deu um beijo em sua testa. A porta do elevador se abriu, ela saiu sorrindo.

—Até lá então, Gu.
—Até. — Ele disse e apertou o botão do elevador.

Ela viu o rosto dele desaparecer à medida que as portas do elevador se fechavam, mandou um beijo e saiu do edifício. Ela sorria, a felicidade por ter conseguido dizer o que queria, somada ao café que iriam tomar, faziam com que ela se sentisse esperançosa. A chuva havia diminuído para pequenas gotículas geladas em sua pele, ela atravessava a rua quando o celular tocou e ela se virou para pegá-lo no bolso de trás da calça.
Não se sabe de onde veio aquele carro a cento e quarenta por hora, ou quem era o motorista, que saiu sem socorrê-la. Seu celular caiu, ainda tocando, enquanto ela atingiu o chão. Várias pessoas se juntaram ao lado dela, ligando para o socorro que chegaria tarde demais. Ela olhava as gotas finas que caíam, sem conseguir senti-las, ficou imaginando o café por um segundo.
Então tudo se apagou.

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